quinta-feira, 8 de abril de 2010

Histórias do Velho Oeste


Havia uma Isabel em cada uma destas meninas.







Isabel a mulher que desafiou Deus e todo mundo.

Obedecei mais aos que ensinam
Do que aos que mandam
Santo Agostinho

Outra experiência dolorosa atingiu a vida de Isabel. Havia uma pessoa que amedrontava a maioria das crianças da época: o professor. Esta personalidade forte, marcante na vida comunitária, de moral inviolável, era vista pelos seus alunos como algo que não podia, de forma alguma, ser contrariado ou desobedecido. Para além do saudosismo, é preciso assumir que o professor era extremamente autoritário e temido, longe dos padrões atuais. Era essa a concepção de professor para a época até o dia em que uma menina decidiu fazer o contrário.
Era um daqueles dias insuportáveis de verão. Todos os dias a mesma rotina iniciava na escola com uma aula de ensino religioso. Nessa aula, os alunos aprendiam o catecismo, liam o evangelho, cantavam músicas sacras e rezavam. Antes de iniciar a aula, o professor fez uma promessa que entusiasmou os alunos:
- Hoje nós vamos fazer uma atividade diferente. Vamos sair da sala de aula para ter contato com a natureza.
Aquela possibilidade entusiasmou a todos. O que será que iríamos fazer? Para onde iríamos? Tomar um banho na cachoeira perto da escola era o desejo de todos, mas todos sabiam que esse era um desejo impossível de se concretizar.
- Muito bem, primeiro nós temos que ver quem de vocês decorou o “Creio em Deus Pai”, porque quem não decorou irá ficar de castigo na sala – alertou o professor.
Depois da primeira aula de orientações religiosas, o ânimo estava exaltado entre as crianças. Para elas era algo formidável abandonar aqueles assentos desconfortáveis e fugir do calor insuportável da sala de aula.
- Muito bem alunos, hoje nós vamos ter uma aula importante para a vida de vocês. Quando crescerem, vocês terão que ser católicos fervorosos e acima de tudo, terão que ser homens e mulheres que preguem os valores da família e do trabalho árduo. Por isso, hoje todos vocês vão trabalhar nesta plantação de milho.
Aquela notícia deixou Isabel atordoada. Era essa a aula ao ar livre? Ela desejava tocar a água, desejava ter lições sobre espécies de árvores, conhecer animais, ver o voar dos pássaros e descobrir os mistérios da natureza. Mas trabalhar na plantação de milho? Ainda mais no milho que pertencia a roça do próprio professor?
Ao sinal de ordem do professor, todos os colegas de Isabel se puseram a arrancar o inço que infestava aquela plantação de milho. Até mesmo o pequeno Joaquim, de família nobre, que jamais havia trabalhado numa tarefa tão árdua, estava empenhado na atividade. Isabel ficava observando as mãos calejadas de seus colegas, seus corpos já eram a expressão de uma vida sofrida, até mesmo nessa idade.
Quando o professor percebeu que Isabel não estava trabalhando, chamou a sua atenção com uma voz rude. Isabel ficou ali parada, decepcionada, mas também indignada. Uma força maior a impedia de não obedecer às ordens do professor.
- É assim menina? Como você ousa desobedecer a seu professor? Você não vai trabalhar, então terás o castigo que merece. Primeiro despejou uma série de palmadas em Isabel, e em seguida, a prendeu de uma capunga – patente no vocabulário popular, espécie de fossa onde as pessoas faziam suas necessidades fisiológicas. Quando fechou a porta o professor ao longe ainda advertiu:
- Se prepare menina, pois amanhã teu pai vai vir para escola.
Aquele lugar possuía um odor fétido. Trancada ali no escuro, Isabel se pôs a chorar. Em momento algum se arrependia por tal ato de indisciplina, e sabia que iria pagar caro por isso. Isabel ficou trancada ali por mais de ma hora.
Do lado de fora, todos os seus colegas trabalhavam assustados com medo de receberam o mesmo castigo. Joaquim, não conseguia se conformar em aceitar tal situação.
- Você é mesmo um medroso, não é Joaquim. A Isabel presa naquele lugar imundo, e você aqui sem coragem para reagir? Aquela mesma menina que dias atrás o veio tirar das cordas e te mostrou a liberdade – pensava ele consigo.
Depois do castigo, Isabel foi obrigada a sentar no fundo da sala, isolada pelo fedor que exalava de seu corpo. A pequena menina sentiu a pressão moral do professor e a indiferença de grande parte de seus colegas. Mas ela sabia que havia lutado por uma causa justa. Seu orgulho alimentava o sentimento de que era necessário o esforço pessoal por uma causa coletiva. A partir daquele dia, o professor nunca mais forçou os alunos a fazer tal atividade. Seu sentimento humanitário estava ferido, e a culpa por ter imposto um castigo tão cruel a essa pobre menina o atordoava.
Na semana seguinte, a turma de Isabel fez um novo passeio, agora para conhecer a cachoeira que jorrava no riacho perto da escola. Era mais uma vitória.
Depois de o pai ir para a escola, Isabel sentiu a dor física de seu ato: uma surra tremenda, que deixou marcas nas coxas de Isabel. Além das marcas físicas, as marcas sentimentais...